O ano era 2014. Em 13 de julho, no Maracanã, a Alemanha vencia por 1 a 0 na prorrogação e mostrava para a Argentina o que era perder uma final das mais desgastantes, garantindo o tetra germânico e a desilusão azul e branca, derrotada mesmo com o gostinho de ter até mesmo superado uma adversária que havia atropelado o anfitrião Brasil por 7 a 1 na semifinal.
Oito anos e quatro meses depois, as duas seleções voltam a cruzar seus caminhos, mas por um motivo que não tem a ver com o peso das suas camisas. Elas podem se cruzar no terminal do aeroporto na viagem para casa ainda na primeira fase da Copa do Mundo do Qatar, sequer chegando às oitavas, repetindo a sequência de frustrações iniciada no Mundial de 2018, na Rússia.
Da final ao fim precoce
Quatro anos são uma eternidade no esporte de alto rendimento. Mesmo com a distância para a decisão conjunta de 2014, Alemanha e Argentina chegaram à Copa do Mundo da Rússia na condição de favoritas. Especialmente a Alemanha.
Muito temida, ela foi eliminada ainda na primeira fase, perdendo por 2 a 0 para a Coreia do Sul e terminando na lanterna de um grupo que tinha também Suécia e México.
Nunca os alemães haviam caído na fase de grupos da Copa. A pior campanha até então tinha ocorrido em 1938, quando a competição era disputada em formato de mata-mata desde o começo.
Desde 2006 com o técnico Joachim Löw no comando, os germânicos chegaram pelo menos entre os quatro primeiros em seis torneios, contando Mundiais e Eurocopas. Nas eliminatórias europeias, foram 10 vitórias em 10 jogos, fato inédito para o futebol alemão.
Löw poderia ter mudado o curso da preparação, mas preferiu seguir firme com as suas ideias. Recebeu críticas, por exemplo, por descartar o meia-atacante Leroy Sané, 22, do Manchester City.
Até um problema novo surgiu. A linha de zagueiros, desprotegida, foi presa fácil para os contra-ataques. O setor de defesa do meio-campo, com Khedira e Kroos, também passou a perder demais a bola.
Contra a Coreia do Sul, os veteranos voltaram, e os problemas também.
Talvez o técnico pudesse ter aceitado a ideia de colocar mais jovens jogadores na primeira fase da Copa do Mundo, assim como fizera na Copa das Confederações (os alemães ficaram com o título).
Muito se duvidou sequer se a Argentina disputaria a Copa de 2018. Eram os tempos do enorme caos institucional na AFA (Associação de Futebol Argentino) depois da morte do presidente Julio Grondona, em 2014, dias depois da final contra a Alemanha.
A Argentina estabeleceu um troca-troca de técnicos para suceder Alejandro Sabella. Gerardo Martino, Edgardo Bauza e Jorge Sampaoli comandaram uma equipe que sofreu nas Eliminatórias até a última partida, quando Lionel Messi fez três gols e a azul e branca despachou o Equador.
A falta de organização seguiu na Copa do Mundo da Rússia. Os jogadores e Sampaoli simplesmente cortaram relações, e a Argentina capengou em um grupo com Islândia (1 a 1), Croácia (derrota por 3 a 0) e Nigéria, quando o defensor Marcos Rojo deu a vitória por 2 a 1 e a classificação às oitavas com um gol milagroso aos 41 minutos do segundo tempo.
A sobrevida no Mundial não impediu que Messi e companhia fossem atropelados pela França logo nas oitavas de final, apesar do enganoso 4 a 3 final. Mbappé mostrou que nada seria igual para Mascherano, Higuaín e Sampaoli, todos imediatamente despachados da seleção.
Em seu lugar assumiu o então assistente, Lionel Scaloni, que comandou uma renovação das mais aprovadas. A Argentina saiu da fila de 28 anos sem títulos ao bater o Brasil e ganhar a Copa América no mesmo Maracanã onde chorou a final de 2014 para a Alemanha.
O título e a maior sequência invicta da sua história pareciam levar a Argentina a uma condição de favorita à Copa do Mundo do Qatar, mas veio então a terça-feira histórica que terminou com a vitória de virada da Arábia Saudita por 2 a 1 e a (mais uma) constatação de que “não se come o churrasco antes de ficar pronto”, metáfora comum na Argentina para explicar que não se ganha jogo de véspera. Principalmente na Copa do Mundo.
A mescla de inexperiência do técnico Scaloni e a má condição física de três jogadores (o zagueiro Romero, o volante Paredes e o atacante Di María) deixaram a Argentina nas cordas e correndo sério risco de voltar para casa logo na primeira fase.
Ela precisa agora se recuperar diante do México às 16h (de Brasília) deste sábado (26), e de quebra fazer as contas para ver o que acontece na outra partida do grupo, Arábia Saudita x Polônia, às 10h do mesmo dia.
Vergonha alemã
Depois da decepção na Rússia, a Alemanha resolveu apostar numa mudança de comando. Hansi Flick, que fora auxiliar de Joachim Low na seleção e saíra para brilhar no Bayern, assumiu a equipe em 2021 e levou adiante uma mescla interessante entre veteranos e jovens.
O goleiro e capitão Manuel Neuer, por exemplo, abriu sua quarta Copa, sendo remanescente da conquista ante a Argentina em 2014.
Com o time quase todo em plena atividade na Bundesliga, das ligas mais organizadas do mundo, esperava-se que a Alemanha tiraria vantagem de atletas de reconhecida capacidade em seus clubes, como Ilkay Gündogan (City), Joshua Kimmich, Thomas Müller (dupla do Bayern) e Kai Havertz (Chelsea).
Nas Eliminatórias, os alemães varreram a concorrência — em 10 jogos, nove vitórias e apenas uma derrota. Mas na estreia ante o Japão, nesta quarta, de virada, 2 a 1 como a Argentina, foi um “leão para atacar e um gatinho para se defender”, como analisou Rodrigo Coutinho, colunista do UOL:
“Os japoneses surpreenderam. Resistiram aos europeus durante boa parte do jogo, contaram com excelentes mexidas de seu treinador na segunda etapa, e aproveitaram a debilidade do sistema defensivo dos favoritos, que terão problemas para ir longe caso mantenham o desequilíbrio desta quarta”.
A resposta sobre a reação ou a eliminação virá no domingo, também às 16h, mas contra um adversário bem mais difícil que o México que será encarado pela Argentina.
Uol