Jair Bolsonaro se tornou réu porque a Primeira Turma do STF decidiu de forma unânime que a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) deveria ser aceita.
Bolsonaro e os outros sete réus responderão a acusações por cinco crimes: golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
Mas o que significa ser réu?
Significa que o STF entendeu que há indícios suficientes na denúncia da PGR para abrir um processo penal contra o ex-presidente e outros sete ex-integrantes do seu governo.
Isso não significa que eles já foram considerados culpados. É justamente ao longo do processo que a acusação tentará provar suas acusações, enquanto a defesa tentará provar a inocência dos réus.
O processo penal é composto por três etapas.
A primeira é a instrução criminal, em que serão produzidas as provas do processo — que poderão confirmar a acusação ou comprovar a inocência dos réus.
Nessa fase, podem ser realizadas perícias, quebras de sigilo, inclusão de documentos, assim como o depoimento das testemunhas indicadas pela acusação e pela defesa.
Depois, será realizado o interrogatório dos réus, para que eles possam dar sua versão sobre as provas produzidas.
E, na última etapa, ocorre a apresentação das posições finais das partes (alegações finais) pela PGR e depois pelas defesas.
Concluídas as três etapas, o relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes, vai produzir seu voto e liberar o caso para que seja marcado o julgamento na Primeira Turma.
É aí que acontece o julgamento propriamente dito, quando esses cinco ministros do Supremo vão decidir se o ex-presidente é culpado ou não dos crimes. Leia aqui os detalhes, passo a passo.

2. Por que Bolsonaro está sendo julgado?
O ex-presidente Jair Bolsonaro foi denunciado criminalmente PGR em fevereiro deste ano, acusado de ter liderado um suposto plano de golpe de Estado após ter perdido a eleição de 2022 para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Outras 33 pessoas foram denunciadas com ele. As denúncias foram divididas em núcleos — as oito pessoas cujas denúncias estão sendo julgadas agora fazem parte do núcleo 1.
A PGR pediu que o ex-presidente responda pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, além de deterioração de patrimônio tombado.
A denúncia vincula a ação de Bolsonaro aos atos de 8 de janeiro de 2023. Na ocasião, milhares de pessoas contrariadas com a vitória de Lula invadiram e depredaram as sedes do Congresso Nacional, Palácio do Planalto e STF.
A defesa do ex-presidente nega todas as acusações.
Nesta terça-feira, seu advogado, Celso Vilardi, afirmou que Bolsonaro seria o ex-presidente “mais investigado” da história do Brasil, mas que a PGR não teria encontrado elementos que comprovem a participação do ex-presidente na suposta trama golpista.
Segundo o advogado, seria impossível atribuir a Bolsonaro a responsabilidade por qualquer tentativa de golpe considerando que os atos investigados teriam tido início, segundo a denúncia da PGR, em 2021.
“Estamos tratando de uma execução que se iniciou em dezembro de 2021, tratando do crime do governo legitimamente eleito. Qual era o do governo legítimo? O dele. Então esse crime é possível, com todo o respeito […] Nem o delator [Mauro Cid] que o acusou fez qualquer relação dele com 8 de janeiro”, disse o advogado.
Somadas, as penas às quais Bolsonaro pode ser condenado podem superar os 40 anos de prisão.
3. Quem é o advogado de Bolsonaro?

O coordenador da defesa de Bolsonaro é o advogado Celso Sanchez Vilardi. Ele é um conhecido advogado criminalista baseado em São Paulo que, ao longo dos últimos 30 anos, atuou em alguns dos casos mais conhecidos do país.
Vilardi atuou no julgamento do Mensalão, quando defendeu o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.
Uma de suas especialidades foi atuar em acusações de corrupção.
Em 2009, por exemplo, ele defendeu a empreiteira Camargo Corrêa e conseguiu a anular as investigações da Operação Castelo de Areia, deflagrada pela Polícia Federal, que investigava denúncias de corrupção semelhantes às que foram reveladas anos mais tarde pela Operação Lava Jato.
Durante a Lava Jato, Vilardi atuou para empreiteiras como a Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez.
Além disso, defendeu alguns dos executivos investigados e chegou a negociar acordos de colaboração premiada com o Ministério Público Federal (MPF).
Entre os clientes famosos de Vilardi estão o empresário Eike Batista, que também foi alvo da Lava Jato.
4. Quem é Demóstenes Torres?

Outro termo que também apareceu nas buscas dos internautas em relação ao julgamento da denúncia foi o nome do ex-senador Demóstenes Torres.
Torres fez carreira como promotor no Ministério Público de Goiás (MP-GO) e como secretário de Segurança Pública de Goiás, antes de entrar na disputa por cargos eletivos.
Em 2002, foi eleito senador e reeleito oito anos depois, em 2010.
Ao longo deste período, chegou a ser mencionado como um dos parlamentares mais influentes do país, especialmente durante sua atuação como opositor do governo do então presidente Lula e em meio ao escândalo do Mensalão.
Em 2012, porém, seu nome veio à tona em investigações relacionadas ao empresário Carlinhos Cachoeira, suspeito à época de ter ligações com o jogo do bicho.
Demóstenes foi acusado de agir no Congresso, no Judiciário e no Executivo em favor do empresário Carlinhos Cachoeira, suspeito de comandar um esquema de corrupção e de exploração de jogos ilegais.
Em troca, segundo a Procuradoria Geral da República (PGR), o senador teria recebido R$ 3,1 milhões do grupo do empresário, além de presentes.
Demóstenes também foi acusado de ter mentido ao Senado quando negou conhecer as atividades ilícitas de Cachoeira.
Em julho de 2012, ele foi cassado pelo Senado, tornando-se o segundo senador na história a ter o mandato cassado pela Casa.
À época, o senador disse que não beneficiou Cachoeira e que não recebeu dinheiro dele. O então parlamentar afirmou que a Polícia Federal teria feito uma “divulgação seletiva” das gravações de suas conversas com Cachoeira, com o objetivo de prejudicá-lo.
A defesa de Demóstenes passou, então, a questionar a validade das gravações como prova no processo uma vez que elas não teriam sido feitas com autorização do STF, a instância supostamente adequada para autorizar esse tipo de medida contra parlamentares com foro privilegiado.
Em 2016, quatro anos após ser cassado, o STF acatou a tese de sua defesa e anulou as provas da investigação ligando seu nome a Carlinhos Cachoeira.
Nos últimos anos, Torres ainda tentou voltar à vida política e se candidatou a deputado federal por Goiás em 2018, mas não conseguiu se eleger. Obteve 27.801 votos, menos de 1% do eleitorado.
Desde então, Torres vem se dedicando novamente à carreira jurídica e hoje comanda um escritório de advocacia com uma equipe de aproximadamente 20 pessoas.
Ele já atuou em casos de repercussão nacional como o do médium João Teixeira de Faria, conhecido como João de Deus, condenado a mais 118 anos de prisão por crimes sexuais.
BBC