Em viagem à Indonésia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) confirmou ontem que será candidato a um quarto mandato. O anúncio ocorre na mesma semana em que o petista reforçou o peso da esquerda no seu entorno mais próximo, com a nomeação do deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) para um ministério, em mais uma mostra de distanciamento do centro que pretende adotar para o ano eleitoral. De olho nos dividendos políticos, Lula também tem antecipado medidas que miram a classe média, como um programa de reforma de casas, e vem buscando repetir fórmulas que o levaram a subir três vezes a rampa do Planalto.
Dada como certa no mundo político, a candidatura de Lula foi confirmada a quatro dias de o presidente completar 80 anos, e na viagem onde deve se encontrar pessoalmente com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
— Eu quero lhe dizer que eu vou completar 80 anos, mas pode ter certeza de que eu estou com a mesma energia de quando tinha 30 anos de idade. E vou disputar um quarto mandato no Brasil — afirmou Lula — Esse meu mandato só termina em 2026, no final do ano. Mas eu estou preparado para disputar outras eleições — completou o presidente.
Lula já vinha se colocando para a corrida eleitoral nos últimos meses e reservando o final de seus discursos para acentuar o tom eleitoral. O presidente afirmou diversas vezes que seria candidato para “não deixar a extrema direita” voltar a governar o país. Ele ressaltava, porém, que entrar na disputa dependeria da sua saúde.
Estratégias conhecidas
Lula quer manter a esquerda unida e mobilizada e trabalha para avançar em segmentos como a classe média, com viagens pelo país para divulgar programas. O petista usou a mesma estratégia em 2005, quando enfrentava uma forte queda de popularidade devido ao escândalo do Mensalão. Na época, assim como em boa parte deste ano, a desaprovação de Lula ultrapassou a aprovação: em setembro de 2005, a gestão era vista como ótima ou boa por 29%, enquanto 32% avaliavam o governo como ruim ou péssimo, faixas parecidas com as atuais (38% a 30%).
O presidente então intensificou as viagens pelo país para sair da crise e foi reeleito em 2006, no segundo turno, na disputa contra Geraldo Alckmin. Para chegar à vitória, o governo também partiu para uma estratégia de enfrentamento e esquerdização como busca agora.
Ao contrário das oportunidades em que tinha a máquina na mão, as vitórias do Lula 1 e Lula 3 foram marcadas pela aproximação com o centro, em uma composição que o permitia atingir uma parcela da população que o rejeitava. Em 2002, após três derrotas em corridas presidenciais, o petista passou a percorrer o país para apresentar seus projetos e construir apoios ao futuro governo para além de seu campo político. A pecha de radical havia lhe custado derrotas, levando o petista a uma repaginação.
Já em 2022, quando articulava a busca pelo terceiro mandato, o petista trabalhou nos bastidores pela chapa Lula-Alckmin, que foi selada em um jantar ocorrido em dezembro daquele ano.
Agora, o presidente deu a largada na estratégia de reeleição reforçando seu núcleo duro com mais protagonismo à esquerda. Seis meses depois de sondar Boulos para comandar a Secretaria-Geral da Presidência, Lula efetivou nesta semana a troca. A pedido do presidente, o ministro deve fazer um giro pelo Brasil para ouvir demandas de grupos organizados e terá a tarefa de engajar os mais jovens e tentar emplacar pautas que o governo não consegue avançar, como diálogo com motoristas de aplicativo.
Lula já havia reforçado o gabinete presidencial com outros ministros responsáveis por elaborar estratégias para campanha: a ex-presidente do PT Gleisi Hoffmann, na Secretaria de Relações Institucionais, e o marqueteiro Sidônio Palmeira, na Secretaria de Comunicação Social. Também faz parte desse grupo Rui Costa, da Casa Civil, que comanda a pasta desde o início do mandato. Aliados apostam nesse núcleo, além do presidente do PT, Edinho Silva, para montar o “bunker” de Lula para buscar um quarto mandato.
Desde que o Congresso derrubou o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), Lula vem apostando no embate entre ricos e pobres. E o governo continuará a apostar no discurso do “nós contra eles”.
— A sociedade está mais politizada, isso requer um governo mais presente, com disposição para a disputa, com mais visibilidade, com Boulos andando pelo país. Isso dá uma cara diferente para o Planalto, que não será mais o mesmo com Boulos. E que já vinha mudando com a chegada da Gleisi — afirma o deputado Rui Falcão (PT-SP), ex-presidente do partido.
Após comandar o PT por oito anos, Gleisi chegou ao comando da articulação política do governo em março. Há dez dias, a pedido de Lula, vem liderando o processo de demissões de indicados de parlamentares infiéis.
Combo eleitoral
Para a recomposição desses postos em funções de comando regional e estadual, Gleisi colocará na mesa o apoio a Lula em 2026. As conversas vêm sendo conduzidas com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e líderes dos partidos, dentro de uma estratégia que mira ao menos dividir parte das legendas do Centrão.
Nesta semana, o presidente decidiu adiantar o lançamento do programa Reforma Casa Brasil. Previsto inicialmente para ocorrer no começo de novembro, quando efetivamente começa a valer, foi adiantado para segunda-feira. O combo eleitoral reúne o vale-gás, a tarifa social de energia elétrica e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, além do novo modelo de crédito imobiliário com recursos da poupança, que mira financiamentos de até R$ 2,5 milhões.
No início do mandato, o presidente fazia cobranças pelo incremento e maior divulgação de programas sociais já consagrados, como o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida. Após uma análise do governo, porém, o Palácio do Planalto entendeu que essas políticas não são suficientes para catapultar a campanha.
Entre as novas medidas, também virou um trunfo a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) mais barata. O projeto pretende reduzir o custo da emissão do documento em até 80%. Monitoramentos internos apontam que a população aprova a iniciativa e a reconhece como programa de Lula. O governo também passou a defender estudos sobre a tarifa zero no transporte público e tem se engajado a favor do fim da escala 6×1, em busca de bandeiras para as eleições do ano que vem.
— Não há no campo progressista outro nome possível que não o do presidente Lula — disse o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP).
O Globo







