É isso mesmo que você leu. Em fevereiro, pela primeira vez, uma inteligência artificial irá aconselhar um réu dentro de um tribunal. A IA vai rodar em um smartphone, ouvindo em tempo real tudo o que for falado e instruindo o réu, por um fone de ouvido, sobre o que ele deve dizer.
A localização do tribunal e o nome do réu estão sendo mantidos em sigilo pela DoNotPay, empresa que criou a IA – porém, entende-se que ele seja acusado de excesso de velocidade no trânsito.
O caso está sendo um teste para a empresa. Joshua Browder, fundador da DoNotPay, também se comprometeu a pagar eventuais multas caso percam o caso.
Usar um smartphone ou computador conectado a um dispositivo intra-auricular em um tribunal seria considerado ilegal na maioria dos países; contudo, a DoNotPay afirma ter encontrado uma brecha na lei que permite classificar o dispositivo como um aparelho auditivo e, portanto, legal. “Está, tecnicamente, dentro das regras, mas não acho que esteja no espírito das regras”, diz Browder.
A DoNotPay foi inicialmente criada como um chatbot que fornecia aconselhamento jurídico a consumidores. A empresa começou a se concentrar mais na área de inteligência artificial em 2020, depois que a OpenAI, responsável pelo DALL-E 2 e o ChatGPT, disponibilizou para o público uma interface de programação com as habilidades do GPT-3, sua IA de processamento de linguagem.
Inteligências artificiais precisam ser alimentadas com muita informação para funcionarem corretamente; e Browder afirma que demorou muito para treinar a IA do DoNotPay nos amplos tópicos de jurisprudência necessários para que ela fosse uma ferramenta útil – e que se ativesse à verdade.
“Estamos tentando minimizar nossa responsabilidade legal”, conta Browder. “E não seria bom se ela distorcesse os fatos e fosse muito manipuladora.”
A IA também foi ajustada para não reagir automaticamente a tudo o que escutar no tribunal. Em vez disso, vai ouvir os argumentos e os analisar antes de instruir o réu.
Browder iniciou a empresa “por acidente” depois de se mudar do Reino Unido para os Estados Unidos para estudar na Universidade de Stanford. Durante esse período, ele começou a acumular multas de estacionamento que não tinha dinheiro para pagar. Ele afirma ter se tornado um especialista em brechas que permitiriam que ele driblasse o pagamento das multas.
Por ser engenheiro de software, percebeu que o trabalho tedioso de escrever cartas legais para recorrer às multas de estacionamento poderia ser automatizado. A IA da empresa pergunta ao cliente qual é o problema, depois encontra uma brecha e a transforma em uma carta legal, que pode ser enviada à instituição certa ou carregada em um site.
Segundo Browder, seu objetivo final é que o software eventualmente substitua alguns advogados. “É tudo uma questão de linguagem, e é para isso que os advogados cobram centenas ou milhares de dólares por hora”, afirma. “Ainda haverá muitos bons advogados por aí que podem estar discutindo no Tribunal Europeu de Direitos Humanos, mas muitos advogados estão cobrando muito dinheiro para copiar e colar documentos, e acho que eles definitivamente serão substituídos – e deveriam ser substituídos.”
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