O entregador que pedala 12 horas por dia quer juntar dinheiro para tirar carteira de habilitação, sair da bicicleta e ser motorista de aplicativo. O empresário de commodities espera ver o país retomando seu protagonismo global como potência ambiental, enquanto a empreendedora cobra do governo crédito e ferramentas para estimular os pequenos negócios.
Para a engenheira de classe média e o executivo de uma grande rede de varejo, os impostos no Brasil são um problema. Já o vendedor do comércio popular no Rio só não quer mais levar sustos na hora de ir às compras no supermercado, enquanto o executivo do mercado financeiro pede um ajuste nas contas públicas do governo.
Os brasileiros que fazem a economia girar veem 2023 com um misto de esperança por mais renda e emprego e apreensão com a alta da inflação e o esgarçamento das relações pessoais em um país ainda muito polarizado. Em comum, a expectativa de que, neste primeiro ano de um novo governo, o Brasil consiga reencontrar o caminho da prosperidade.
A educação aparece como preocupação compartilhada entre brasileiros de diferentes estratos sociais. Para os trabalhadores, a falta de qualificação é um entrave à ascensão social em um país que, no último ano, só gerou empregos de baixa remuneração. Para os empresários, a dificuldade é recrutar funcionários capacitados.
E, para além da economia, trabalhadores, consumidores e empresários comungam do anseio por melhorias na saúde e na segurança pública no país. Leia, a seguir, o que esperam 12 brasileiros de diferentes perfis para 2023.
Luis Henrique Guimarães, CEO da Cosan, gigante que controla negócios na área de logística ferroviária, distribuição de combustível, lubrificantes, etanol, açúcar e energia, espera, que 2023 “seja um ano de estabilidade, em que a segurança jurídica e a previsibilidade política e econômica sejam pilares que garantam segurança para investimentos.”
Para ele, o Brasil deve priorizar seu potencial ambiental:
— Desejo que o Brasil assuma o seu protagonismo global de ser uma potência verde. Nosso país reúne vantagens competitivas e comparativas fundamentais, que se encaixam perfeitamente nas necessidades globais.
Guimarães ressalta a urgência de organizar as contas públicas:
— São muitos os desafios do novo governo, mas creio que é preciso ter um olhar especial para o equilíbrio fiscal. O governo terá que se esforçar para implementar medidas de controle que possam compensar possíveis novas despesas, construindo, assim, um ambiente propício à geração de negócios e criação de empregos — afirma.
Embora ressalte que “ainda é um pouco prematuro falar em expectativas”, Guimarães destaca que “o discurso oficial do novo governo acenou com bastante força para a área ambiental.”
O sonho de ascensão social que o entregador de comida Germano Nagari, de 29 anos, gostaria de realizar em 2023 é virar motorista de aplicativo ou motoboy. Com apenas a primeira série do ensino fundamental, não consegue emprego formal há mais de cinco anos.
Faça chuva, faça sol, pedala cerca de 12 horas por dia, de segunda a segunda. Não há descanso. Aos fins de semana, o aplicativo que usa para conseguir renda faz promoções de ganho extra e não dá para desperdiçar. No melhor cenário, consegue tirar R$ 700 por semana.
Uma parte dessa quantia tem usado para pagar pela sua habilitação de motorista. A rotina dura, porém, não esmorece os planos de um futuro melhor. Voltar a estudar no ano que vem e comprar um carro ou moto são os objetivos mais imediatos. A longo prazo, deseja sair da casa da mãe, com quem mora em Madureira, e conseguir uma vaga de carteira assinada.
— Quero concluir os estudos e tentar coisa melhor para que, caso eu sofra um acidente, não dependa dos outros. Hoje não tenho a segurança de ficar encostado pelo INSS se algo acontecer.
Para o país, deseja que o desemprego diminua e que os políticos priorizem a educação, para que outros jovens tenham acesso a oportunidades que ele não teve.
À frente do PretaHub e do Instituto Feira Preta, Adriana Barbosa tem atuação reconhecida no impulso a novos negócios. Para ela, em 2023 é preciso voltar as atenções para o microempreendedor individual (MEI).
— O MEI tem de ser revisitado. Há qualificações, sobretudo na cultura, na economia criativa, que ele não reflete. Falta um quesito de cor dentro do MEI. A plataforma deveria ter dados precisos, a serem usados na construção de políticas voltadas para impulsionar o empreendedorismo — destaca ela.
As micro e pequenas empresas respondem por 30% do PIB do país e 44% da massa salarial, segundo dados do Sebrae. Adriana alerta, porém, que é preciso atuar em quatro frentes para ajudar quem é MEI a quebrar o “teto de vidro” do microempreendedorismo e avançar com seu negócio:
Uma sociedade mais justa e igualitária é o sonho da enfermeira e servidora pública Monica Armada, de 53 anos. Para ela, a vida da população como um todo irá melhorar com mais emprego e maior renda no ano que vem. Por isso, avalia como acertada a decisão de ampliar os gastos públicos para garantir benefícios sociais. Em sua visão, a liberação de recursos pode estimular a economia, promovendo a abertura de vagas.
A empatia, necessária em seu ofício de enfermeira, faz com que ela saiba o quão urgente é combater a fome no Brasil, agravada pela pandemia. Ela diz ainda que garantir moradia digna a qualquer cidadão também é vital:
— A população de rua aumentou muito nos últimos anos. Essa é uma questão grave.
Monica também se preocupa com a segurança pública. Além da violência decorrente da polarização política, reclama do alto índice de mortalidade de policiais no Rio de Janeiro e das vítimas das operações em periferias.
— A gente viu o que aconteceu em Brasília com aquela bomba no aeroporto. É um ponto de atenção para o próximo governo. É preciso pacificar as cidades. Outra coisa é que temos a polícia que mais mata e que mais morre. É preciso mais treinamento .
O controle da inflação é o principal desejo do CEO da Tenda, Rodrigo Osmo, já que a empresa sofre com a alta dos preços de materiais de construção. Para ele, a implementação das reformas administrativa e tributária é um desafio para o novo governo, e ambas são o melhor caminho para sinalizar ao mercado financeiro que a trajetória da dívida pública não é ascendente:
— As quebras na cadeia de suprimentos, por causa da crise sanitária da Covid-19 e da guerra na Ucrânia, foram prejudiciais. Mas estamos otimistas para o próximo ano. O governo sinalizou que vai facilitar para as famílias de menor poder aquisitivo o acesso à moradia, foco do nosso negócio.
Para além da economia, Osmo tem esperança de observar uma trégua entre as instituições e também um alívio na polarização política na sociedade, que entende como prejudicial:
— Houve esgarçamento entre Executivo, Judiciário e Legislativo. É importante que cada um desses atores se retenha ao papel institucional que precisa seguir. Na sociedade, não há mais espaço para debate. A população saiu muito polarizada da última eleição, o que afetou muitas relações pessoais. Quanto mais pudermos ser plurais, mais vamos avançar como sociedade.
Para que o Brasil siga em rota de avanço, em 2023 é preciso privilegiar áreas como educação, saúde, segurança, inovação, empreendedorismo, tecnologia, e tantas outras, que merecem a atenção de políticas públicas e de investimento privado, avalia o CEO do Banco XP, José Berenguer.
Ele diz que o país tem questões imediatas a resolver, mas não pode deixar de pensar no que quer ser no futuro, buscando ser cada mais inclusivo e desenvolvido:
— O Brasil precisará equacionar os anseios dos campos social e econômico. O mercado tem dado sinais de preocupação em relação à situação fiscal do país. Todos sabemos que ninguém ganha com o descompasso das contas públicas.
Para ele, a condução do ajuste fiscal é o tema prioritário na agenda. Berenguer acredita que o novo governo tem disposição e todos os instrumentos para ser efetivo na gestão do Orçamento. Ele observa que os contextos social, político e econômico dos últimos anos aumentaram a desigualdade social e afetaram a produtividade do país.
— Espero que o país se fortaleça, que as empresas continuem crescendo, e que surjam novas oportunidades, que alavanquem emprego e renda — avalia.
Otimizar a produção industrial é o desafio mais urgente para o primeiro ano do governo Lula, avalia o presidente da Ternium Brasil, Marcelo Chara. Embora acredite que 2023 será desafiador diante do cenário global com previsão de recessão nas maiores economias do mundo e impacto da crise energética, ele ressalta que o país, após queda forte da participação da indústria no PIB, terá a oportunidade de retomar esse espaço:
— A reforma tributária está na agenda do novo governo, e esperamos que tenha impacto positivo na competitividade da indústria brasileira. O desenvolvimento do mercado de gás natural, com maior oferta do combustível e preço mais competitivo, também é um tema prioritário para a indústria.
Para Chara, a reforma tributária é o principal meio para gerar impacto positivo na competitividade da indústria. Ele aponta ainda a necessidade de mais investimentos em educação para gerar oportunidade para os jovens.