O republicano Donald Trump foi reeleito para a Casa Branca como o primeiro ex-presidente americano a ser condenado criminalmente na História dos Estados Unidos. Em maio, um júri popular considerou o magnata culpado de todas as 34 acusações das quais era alvo em um caso sobre falsificação de registros para encobrir um escândalo sexual que ameaçava prejudicar sua campanha presidencial em 2016. Apesar de ter vencido o pleito, o magnata ainda aguarda a sentença do caso, marcada para ser divulgada em 26 de novembro.
Em setembro, o juiz que presidiu o julgamento adiou a sentença para três semanas após o dia das eleições americanas. A decisão marcou mais um atraso — uma constante em todos os casos criminais de Trump desde que ele foi indiciado quatro vezes (em Nova York, na Flórida, em Washington, D.C. e na Geórgia) em 2023. Agora, no entanto, é provável que o Departamento de Justiça de Trump abandone as acusações federais contra ele em ao menos dois casos: o da Flórida, em que ele é acusado de reter documentos sigilosos em sua mansão em Mar-a-Lago, e os relacionados ao 6 de janeiro, quando houve a invasão do Capitólio.
Isso porque Trump já afirmou que demitirá Jack Smith, o procurador especial que liderou as investigações e processos federais contra o republicano nos últimos dois anos. Não há muita dúvida de que um procurador-geral indicado por Trump abandonaria as acusações após ser confirmado no cargo. Desde que os processos foram abertos, a principal estratégia do magnata foi adiar os julgamentos para até depois da eleição para que, se eleito, ele possa demitir o procurador e encerrar os casos.
Em outubro, ao ser questionado se ele “perdoaria” ou demitiria Smith caso fosse reeleito, Trump afirmou que o demitiria “em dois segundos”. Até o dia da posse, em 20 de janeiro, porém, Smith ainda tem tempo para avaliar suas opções, publicou a CNN americana. A dúvida que fica é se o Escritório de Assessoria Jurídica do Departamento de Justiça considera que um presidente eleito tem a mesma proteção legal que um presidente em exercício. Essa orientação deve determinar o próximo curso de ação, segundo relatos de pessoas informadas sobre o assunto ao jornal.
Saiba como estão os processos contra Trump hoje:
Sentença em Nova York
O primeiro julgamento criminal de um ex-presidente dos Estados Unidos teve como pano de fundo os esforços de Trump para encobrir um caso sexual: na véspera das eleições presidenciais de 2016, na qual saiu vitorioso, ele teria subornado a ex-atriz pornô Stormy Daniels para que ela não comentasse sobre uma relação extraconjugal ocorrida uma década antes. Segundo a Promotoria, o republicano realizou uma série de fraudes contábeis em sua empresa, a Organização Trump, para mascarar o pagamento de US$ 130 mil à atriz em troca do seu silêncio.
A princípio, o republicano deverá comparecer a um tribunal de Nova York em 26 de novembro para receber a sentença por sua condenação, mas ainda não está claro se essa sentença realmente será emitida. Juan Merchan, o juiz que presidiu o julgamento, deu a si mesmo o prazo de 12 de novembro para decidir se anulará a condenação com base na decisão da Suprema Corte, que, em julho, determinou que Trump tem direito a algum nível de imunidade contra acusações criminais por ações tomadas oficialmente durante o mandato. A depender da decisão de Merchan, as acusações podem ser descartadas.
Caso ele decida manter a condenação, é esperado que os advogados de Trump peçam a Merchan para adiar a sentença para que possam recorrer. E, se isso também não for concedido, a defesa do republicano planeja recorrer da decisão de imunidade para os tribunais de apelação estaduais e potencialmente até a Suprema Corte dos EUA, publicou a CNN. Se o juiz prosseguir com a sentença, Trump pode ser condenado a até quatro anos de prisão, embora também possa ter uma pena menor, como prisão domiciliar, serviço comunitário ou apenas uma multa.
Como o caso é estadual, Trump não terá o poder de conceder a si mesmo o perdão presidencial.
No caso em Washington, D.C, Smith acusou Trump de tentar reverter o resultado eleitoral de 2020. O caso ficou parado por meses enquanto o republicano continuava pressionando os tribunais federais a lhe concederem imunidade presidencial. Agora, o juiz responsável pelo julgamento está decidindo até que ponto a conduta de Trump é protegida pela imunidade. A ponderação ocorre após os promotores apresentarem seus argumentos no mês passado, quando explicaram os motivos pelos quais a decisão da Suprema Corte não deveria afetar o caso.
Já o caso da Flórida teve início após Trump ser acusado de ter levado ilegalmente documentos sigilosos e confidenciais da Casa Branca e de resistir às tentativas do governo de recuperar esses materiais. A acusação de 49 páginas, apresentada em junho de 2023, apontava que os documentos mantidos por Trump incluíam alguns envolvendo programas nucleares sensíveis e outros que detalhavam as potenciais vulnerabilidades do país a ataques militares. Esse caso foi arquivado em julho pela juíza Aileen Cannon, mas os promotores recorreram.
Caso na Geórgia
No caso da Geórgia, os promotores apresentaram 41 acusações (no processo judicial americano, cada ação delitiva exige uma acusação à parte). Apenas contra Trump foram 13, incluindo falsificação e racketeering (organização criminosa). As demais envolvem aliados do republicano, como o advogado Rudolph W. Giuliani, ex-prefeito de Nova York, e Mark Meadows, ex-chefe de Gabinete da Casa Branca.
O destino do caso criminal de Trump na Geórgia depende em grande parte de saber se a Promotora do Condado de Fulton, Fani Willis, uma democrata, será desqualificada do caso devido a um relacionamento romântico anterior com um colega promotor. Mesmo que ela seja autorizada a continuar processando Trump, o caso certamente estará ameaçado agora que ele foi eleito (a decisão sobre se ela permanecerá no caso é esperada para ocorrer apenas em 2025). Caso Willis seja removida, fontes disseram à CNN que é improvável que outro promotor assuma o caso, o que levaria ao seu arquivamento.
Processos civis
Trump também está se defendendo em uma série de processos civis, incluindo casos relacionados ao seu papel no ataque ao Capitólio dos EUA em 6 de janeiro de 2021, dois casos de difamação movidos pela jornalista E. Jean Carroll e um caso de fraude civil aberto pela Procuradora-Geral de Nova York, no qual Trump foi condenado a pagar quase US$ 454 milhões. Em setembro, tribunais de apelação de Nova York ouviram argumentos sobre duas das apelações civis do republicano.
Trump perdeu dois processos de difamação para Carroll em 2023 e 2024 na corte federal, após um júri considerá-lo responsável por abusar sexualmente da ex-colunista e subsequentemente difamá-la. Dois júris concederam a Carroll US$ 5 milhões e US$ 83 milhões. Um tribunal federal ouviu a apelação de Trump para anular o primeiro veredito a favor de Carroll em setembro, mas ainda não emitiu uma decisão.
No mesmo mês, o tribunal também ouviu argumentos para anular a sentença de US$ 454 milhões contra ele. O tribunal de apelação, composto por cinco juízes, pareceu aberto a pelo menos reduzir a multa imposta a Trump, mas ainda não emitiu uma decisão. É possível que todos esses processos continuem mesmo enquanto Trump cumpre seu segundo mandato na Casa Branca. Em uma decisão da Suprema Corte de 1997, originada de um processo civil em que o então presidente Bill Clinton estava envolvido, os juízes decidiram por unanimidade que presidentes em exercício não poderiam invocar imunidade presidencial para evitar litígios civis enquanto estivessem no cargo.
O Globo