Aprovada pela Câmara e em análise no Senado, a chamada PEC da Blindagem — ou PEC das Prerrogativas — representa um dos movimentos mais polêmicos do Congresso nos últimos anos. Sob o argumento de proteger parlamentares contra perseguições políticas, a proposta cria uma série de barreiras que, na prática, tornam quase impossível investigar, processar ou prender deputados e senadores.

Pelos termos aprovados, qualquer ação penal contra um parlamentar só poderá avançar se a própria Casa Legislativa autorizar, em votação que pode ser secreta. Além disso, mesmo em casos de flagrante por crimes inafiançáveis, caberá ao Legislativo decidir se a prisão será mantida. Some-se a isso prazos dilatados de até 90 dias para deliberar e a ampliação do foro privilegiado a dirigentes partidários: o resultado é um pacote que reforça privilégios em vez de combater distorções.
Não se pode ignorar que a imunidade parlamentar existe para proteger o mandato contra abusos do Judiciário ou perseguições políticas. Mas a PEC vai muito além disso. O risco evidente é transformar a Câmara e o Senado em instâncias de blindagem corporativa, onde cada decisão será tomada sob o cálculo das conveniências políticas e não sob o peso da lei.
A crítica mais forte recai sobre o voto secreto. Num momento em que a sociedade exige mais transparência, criar mecanismos que escondem a posição de cada deputado ou senador é um contrassenso. O eleitor tem o direito de saber como seu representante se posiciona diante de denúncias graves contra colegas. Tirar essa visibilidade é um passo perigoso para a democracia.
Outra questão é a ampliação do foro privilegiado para presidentes de partidos. Em vez de reduzir desigualdades e dar exemplo de accountability, o Congresso amplia um benefício que já é alvo de críticas há anos. A mensagem transmitida é de autopreservação, não de responsabilidade pública.
Ao colocar barreiras quase intransponíveis para que a Justiça atue, a PEC fragiliza a credibilidade do Parlamento. O combate à corrupção e aos abusos de poder já é lento e difícil no Brasil; com a nova regra, pode se tornar inviável.
O Senado terá, portanto, a oportunidade de corrigir excessos: retirar o voto secreto, reduzir privilégios e restabelecer o equilíbrio entre proteção parlamentar e responsabilidade criminal. Se não o fizer, a PEC da Blindagem pode se consolidar como um marco negativo — o momento em que os representantes do povo ergueram um muro para se isolar das consequências da lei que atinge qualquer cidadão comum.
Por: Napoleão Soares