A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou, nesta sexta-feira (4), a importação temporária e excepcional da vacina Sputnik V, da Rússia, e da vacina Covaxin, da Índia, no país, com uma série de restrições.
As duas vacinas já tiveram a importação negada anteriormente pela Anvisa, que alegou falta de informações sobre eficácia e segurança, entre outros motivos. Desta vez, a autorização veio com uma série de condicionantes, entre os quais está a liberação apenas para adultos considerados saudáveis.
Grávidas ou mulheres em idade fértil que pretendem engravidar; pessoas com doenças não controladas; pessoas com HIV e quem já sofreu episódio de anafilaxia pós-vacinação não devem receber os imunizantes, segundo a Anvisa.
Para combater à Covid-19, o Brasil dispõe atualmente no Programa Nacional de Imunizações (PNI), do Ministério da Saúde, das vacinas Coronavac (Sinovac/Butantan), AstraZeneca/Oxford/Fiocruz e a da Pfizer/Biontech.
Entenda como os imunizantes Sputnik V e Covaxin funcionam e quais são suas particularidades.
Tecnologia da Sputnik V
Entre todas as vacinas contra a Covid-19 já registradas no mundo, a Gam-COVID-Vac (nome oficial da Sputnik V), produzida pelo Instituto Gamaleya, na Rússia, é a única desenvolvida com dois adenovírus inofensivos, nomeados de D-26 D-5. Esses adenovírus não causam doença no ser humano e são aplicados um em cada dose, o que pode ser considerado duas vacinas em uma.
Os adenovírus são uma família de vírus que atacam humanos e animais e, quando inativados, são considerados vetores, ou seja, servem para transportar material genético de um vírus diferente – no caso a proteína Spike encontrada no coronavírus – para uma célula humana.
Na primeira dose, o D-26 leva a proteína S para dentro das células humanas, o que causará uma resposta imune do organismo, que começa a criar defesa contra a proteína e, consequentemente, anticorpos contra o coronavírus.
Na segunda dose, entra em cena o D-5, outro adenovírus que fará o mesmo papel, mas ao mesmo tempo tende a ser o diferencial mais assertivo do imunizante. Isso porque, segundo cientistas, por ter duas ‘fórmulas’ diferentes, essa vacina pode ajudar a produzir mais anticorpos contra o coronavírus e ser a responsável pela alta eficácia contra o vírus Sars-CoV-2.
Como é administrada a Sputnik V
A Sputnik V é aplicada em duas doses, com 21 dias de intervalo entre elas.
Eficácia da Sputnik V
A vacina que leva o nome do primeiro satélite espacial soviético, lançado em 1957, atingiu uma taxa de eficácia de 97,6%, segundo o Instituto Gamaleya. Ainda conforme o instituto, os dados serão revisados por outros cientistas e publicados em uma revista médica em maio.
Segundo a farmacêutica russa, os dados de eficácia têm como base a análise da taxa de infecção entre os 3,8 milhões de vacinados com duas doses na Rússia entre 5 de dezembro e 31 de março. O dado é superior à eficácia de 91,6% reportada pela revista científica The Lancet, em fevereiro.
Ainda segundo o estudo, a eficácia chegou a 100% para prevenção de casos graves e mortes pela doença, após 21 dias da aplicação da primeira dose. A aplicação do imunizante se dá por duas doses, via injeção intramuscular, com diferença de 21 dias entre cada dose.
Os ensaios clínicos pós-registro envolvendo mais de 31 mil pessoas na Rússia e em Belarus começaram em 25 de agosto de 2020. No período, os Emirados Árabes Unidos, Índia e Venezuela iniciaram testes clínicos locais da vacina Sputnik V.
A vacina recebeu certificado de registro do Ministério da Saúde da Rússia em 11 de agosto e, de acordo com os regulamentos de emergência adotados durante a pandemia de Covid-19, pode ser usada para vacinar a população da Rússia.
Uma versão de apenas uma dose da Sputnik V (a com o adenovírus Ad26), denominada Sputnik Light, demonstrou eficácia de 79,4% 28 dias após a aplicação, segundo o fabricante.
Onde a Sputnik V está sendo usada?
Segundo o site que divulga informações sobre a Sputnik V, criado pelo governo russo, a vacina Sputnik V já foi registrada em mais de 67 países. Argentina, Hungria, Belarus, Jordânia, Iraque, Venezuela, Egito, e agora o Brasil, estão na lista.
Tecnologia da Covaxin
A Covaxin é uma vacina contra a Covid-19 feita de vírus inativado, desenvolvida e fabricada pelo laboratório indiano Bharat Biotech, em colaboração com o Conselho Indiano de Pesquisa Médica (ICMR) do Instituto Nacional de Virologia (NIV).
A vacina é desenvolvida usando a tecnologia de plataforma derivada conhecida como Whole-Virion Inactivated Vero Cell (vírus inativados). As vacinas inativadas não se replicam e, portanto, é improvável que se revertam e causem efeitos patológicos, segundo o fabricante.
Elas contêm vírus mortos, incapazes de infectar pessoas, mas ainda capazes de instruir o sistema imunológico a montar uma reação defensiva contra uma infecção.
Vacinas com vírus inativados, como a Covaxin, têm tecnologia semelhante a de vacinas da gripe, poliomielite, entre outras. É, portanto, uma plataforma bem estabelecida e considerada segura na produção de vacinas.
Como é administrada a Covaxin
A Covaxin é aplicada em duas doses, com intervalo de 28 dias entre cada uma delas.
Eficácia da Covaxin
Ensaios de fase 3 (feitos em humanos e considerado o último estágio de fase clínica), duplo-cego e randomizados, com 25.800 adultos na Índia, demonstraram eficácia da vacina de 78% contra Covid-19 leve, moderada e grave. A eficácia contra Covid-19 grave foi de 100%, com impacto na redução das hospitalizações.
Dos 25.800 participantes, 2.400 voluntários tinham mais de 60 anos e 4.500 com comorbidades.
Segundo o fabricante da Covaxin, a vacina se mostrou eficaz contra a cepa variante do Reino Unido.
Onde a Covaxin está sendo usada?
Índia, Mongólia, Mianmar, Sri Lanka, Filipinas, Bahrein, Omã, Ilhas Maldivas e Ilhas Maurício, segundo o fabricante.
Negociações no Brasil
O Ministério da Saúde já havia solicitado à Anvisa a autorização para importar 20 milhões de doses da Covaxin e aguardava a decisão da agência.
No Brasil, a autorização da Anvisa definiu a quantidade de 4 milhões de doses da Covaxin, que poderá ser utilizada somente sob condições específicas determinadas pela agência.
Ao todo, foram seis pedidos de autorização da importação da Covaxin à Anvisa até a autorização da importação. O último foi apresentado em maio para o Ministério da Saúde.
No penúltimo, feito em março, o colegiado de diretores da Anvisa indeferiu por unanimidade o pedido de Certificação de Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos da fabricante Bharat Biotech.
A autorização de boas práticas era um pré-requisito para que os fabricantes de medicamentos e vacinas recebam autorização para o uso emergencial do imunizante ou o registro definitivo.
Na negativa, a Anvisa destacou a ausência de documentação e preocupação com dados sobre a linha de produção e a segurança do imunizante.
Por outro lado, horas antes da decisão a Anvisa aprovou os testes de fase 3 da Covaxin no Brasil. Para a última etapa de ensaios clínicos, o Brasil vai selecionar voluntários.
Em relação à importação da Sputnik V, as negociações tiveram forte viés político, após o Consórcio Nordeste – conjunto de governadores dos estados nordestinos e alguns do norte – ter negociado diretamente a entrega de 67 milhões de doses com o governo russo.
Com as negativas anteriores da Anvisa, o consórcio chegou a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), que pressionou à agência a dar uma nova resposta sobre a importação.
Neste sábado (5), o consórcio Nordeste emitiu uma nota dizendo comemorar a decisão da Anvisa e informaram que já “estão analisando junto aos fornecedores russos, os procedimentos técnicos mencionados pela Anvisa, visando ajustes contratuais e à execução nos termos das Leis Federais 14.124 e 14.125/2021 [leis referentes ao uso emergencial de medicamentos e vacinas]”.
À CNN, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), afirmou que a Anvisa colocou questões que não estavam previstas no contrato com as autoridades russas e que isso deverá ser discutido com eles para que haja adequação.
CNN Brasil