O governo gastou, até maio, só 30% do dinheiro previsto para a compra de vacinas contra a Covid-19. Dos R$ 22,29 bilhões autorizados, apenas R$ 6,9 bilhões foram efetivamente usados para a aquisição de imunizantes.
O levantamento do Metrópoles foi realizado com base nos dados publicados pelo Painel de Monitoramento dos Gastos da União para a Covid-19, do Tesouro Nacional.
No ano passado, o governo também utilizou apenas uma parcela do montante liberado para esse fim: R$ 2,2 bilhões de R$ 24,51 bilhões (9% do total). Tecnicamente, os valores que ainda não foram honrados ficam como “restos a pagar”, no orçamento do ano seguinte.
Enquanto isso, a vacinação avança em ritmo lento. O Ministério da Saúde distribuiu 115,1 milhões de doses. Cerca de 62 milhões de brasileiros receberam a primeira dose (36% da população adulta) e 24 milhões, a segunda.
O Brasil já computou quase 18 milhões de casos de infecção e mais de 500 mil mortes em decorrência da Covid-19.
Desde o início das negociações por vacinas, o governo federal é criticado devido à demora para fechar acordos e garantir doses ao país. O Ministério da Saúde afirma que já tem conversas adiantadas para adquirir mais 500 milhões de doses.
“Fiasco”
Diretor-presidente do Instituto OPS, entidade de fiscalização das contas públicas, Lúcio Big afirma que, além dos recursos financeiros, imunizar os brasileiros contra a Covid-19 requer um complexo sistema que envolve recursos humanos que vai desde a fabricação da vacina até a sua aplicação.
“Em meio a tudo isso, estão aqueles que detêm o poder de fazer, vagarosamente, essa engrenagem girar”, pondera, ao comentar o ritmo de compra de imunização.
Big considera que a estratégia do governo foi um “fiasco”. “Fazer o Brasil figurar depois da 70ª posição entre os países que proporcionalmente mais vacinaram no mundo é um fiasco para quem sempre foi referência no quesito vacinação em massa. Essa é uma demonstração clara de que estamos perdendo a batalha para a ineficiência. O resultado disso está diante dos nossos olhos. Hospitais lotados e milhares de vidas perdidas todos os dias”, critica.
Versão oficial
O Ministério da Saúde divulgou números diferentes dos publicados pelo Tesouro Nacional. Segundo a pasta, a dotação autorizada foi de R$ 30 bilhões, dos quais R$ 27,5 bilhões empenhados (91,5%), ou seja, comprometidos com fornecedores de vacinas ou outros bens ou serviços necessários à imunização.
Desse montante, os pagamentos alcançam R$ 8,8 bilhões, o equivalente a 29,4% da dotação autorizada. “É importante mencionar que a última MP, a nº 1.048/2021, é de 10 de maio, ou seja, foi editada faz 30 dias”, detalha o órgão, em nota.
A pasta pontuou ainda que o dinheiro é usado conforme a entrega dos produtos. “Os pagamentos ocorrem, em regra, de acordo com as entregas dos bens ou serviços, estando assim os desembolsos associados com os cronogramas de entregas contratados”, frisa o texto.
Processo de compra
O economista e fundador da organização Contas Abertas, Gil Castello Branco, explica que o fato de o governo ter um grande valor empenhado, ou seja, reservado para a compra, não significa necessariamente a concretização da aquisição.
“O fato de ter um valor grande empenhado e um pagamento muito pequeno talvez reflita a dificuldade para a entrega das vacinas. O governo fez a reserva no orçamento, mas tem dificuldade para a aquisição. O pagamento se dá depois da entrega do produto”, explica. E completa: “O empenho é o ovo na barriga da galinha. Ele pode ser cancelado”.
O especialista detalha como funciona o processo de compra governamental. “Normalmente, quando se faz um contrato, se faz o empenho, que é uma reserva orçamentária para o pagamento que vai ocorrer posteriormente. É a garantia para o credor de que a União tem recursos para pagar a despesa. A segunda fase é a da liquidação, que é quando o fornecedor vai entregando, e o governo vai liquidando. É o reconhecimento de que o serviço, ou parte dele, foi prestado. A última fase é o pagamento, quando o dinheiro sai do Tesouro e vai para o fornecedor.”
Metrópoles